Por André Persant
Jornalista, ator e diretor do Coletivo Favela em Cena
(Crédito da imagem: Lenise Pinheiro)
Solidão, espetáculo do grupo Folias D’Arte, escrito por Sergio Roveri é uma
daquelas obras que você tem que ver. O grupo paulistano cria, com maestria,
belíssimas imagens baseadas em obras do realismo fantástico, gênero literário
que foi muito forte principalmente na América Latina, num período em que
vários países passavam por ditaduras militares.
Sobre a batuta de Marco Antonio Rodrigues, o elenco afiadíssimo vai nos
apresentando uma miríade de belas personagens, na história o progresso
chega a uma pequena cidade esquecida e com fortes raízes nativa por meio de
forasteiros e suas novidades danosas. Um cigano imortal, Chema, nos conduz
pela história, o tempo é confuso, não é reconhecidamente linear, a pequena
cidade parece não se dobrar nem a esse que é tido como o “senhor de tudo”.
Mas nada parece realmente ter vida nessa trama, tudo se esvai, tudo se
desmorona. A cidade é infértil e está sendo comida pela praga das formigas.
É nesse ponto que o Grupo Folias nos leva a pensar sobre o nosso próprio
tempo, sobre a nossa América e a infertilidade dos nossos tempos, onde
velhos fantasmas que pensávamos vencidos voltam a nos assombrar.
Solidão é lírico, é explosivo, é sonoro. A música, aliás, é um dos pontos altos
da montagem, bem dirigida e muito bem composta pela dupla Sonia
Goussinsky e Rafael Faustino.
(Crédito da imagem: Lenise Pinheiro)
O elenco dá um show, mas abro agora um parêntese pra falar sobre Ailton
Graça, reconhecidamente hoje um dos maiores atores brasileiros em atividade,
o paulistano de 52 anos dá uma aula de atuação. Seguro no palco utiliza corpo
e voz para as nuances de seu narrador. Dança, o que não é uma novidade pra
ele, mestre sala e coreógrafo de escolas de samba, canta e toca cajón. Com a
responsabilidade de protagonizar a peça, Ailton se mostra a vontade, seja
contracenando com os talentosos parceiros de cena, como interagindo com o
público. Sempre no controle da situação, conduzindo com perfeição a plateia
que se agrada em assisti-lo. Uma estrela. Ver um artista tão talentoso servindo
de referência para nossa juventude preta me enche de esperança.
Vida longa ao espetáculo Solidão! Axé, Ailton Graça, voe cada vez mais alto.