O Mês da Mulher Negra e uma reflexão necessária

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Este não é um artigo científico, é um texto-desabafo que espera desesperadamente ser lido de coração e mente aberta.

Quantas vezes vocês leram pesquisas ou viram reportagens sobre casais que trabalham juntos e como essas histórias de sucesso são inspiradoras (com casais quero dizer sobre os que dividem uma vida amorosa e os que apenas dividem uma vida profissional). Porém, ah porém, nem tudo são flores no mundo machista dos reles mortais e agora eu vou lhes contar alguns dos porquês.

O Júnior criou a Agenda Preta em uma madrugada de novembro de 2015. Apesar de estarmos separados neste período, eu fiquei muito entusiasmada e resolvi retomar contato com ele e participar desta iniciativa mas ainda me faltava coragem.
De novembro de 2015 à janeiro de 2016, a Agenda Preta  ficou quase às moscas até que tomei fôlego e resolvi somar de verdade nesse processo. E como vocês podem ver, desde então a AP não parou de reunir eventos, produzir conteúdo e encabeçar ações e muito disso se deve ao meu envolvimento com o projeto.

E porque estou dizendo isso agora?

Por quê eu dedico meu tempo, minha disposição e meu dinheiro pra esse projeto crescer e se desenvolver e o que eu tenho recebido em troca é o total descaso com o meu trabalho. O Júnior é uma pessoa popular em decorrência ao seu envolvimento com a militância, é obvio, mas em todo o seu discurso ele me coloca como protagonista do projeto mas eu sinto que vocês tem uma leitura seletiva acerca disso e continuam a referenciá-lo como se ele fosse a personificação da Agenda Preta. E isso me leva a uma triste conclusão: Vocês são hipócritas e machistas!

Sim. Vocês são. E isso me choca muito pois não é isso que se espera da comunidade para a qual dedicamos nosso esforço e energia. Definitivamente, não é o que se espera de pessoas esclarecidas, em sua maioria, que se dedicam à lutas importantes como o feminismo e a aquilombação do povo preto.

“Ah, mas a Bruna tá viajando!”

OOOOOOOOOOOlha, eu acho que não, pois cada vez mais tenho observado que esse sentimento de frustração causada por tanta hipocrisia nas pretas que encabeçam projetos e ações. Logo, não é pira minha.

Fica aqui que eu vou explicar os porquês desse pensamento.

PRETOS NO TOPO

A ideia de ver pretos aquilombados buscando melhores condições de vida  é maravilhosa mas ela é falha, infelizmente. Vocês repararam que quem sempre é representado por querer o topo são Os PretOs? É, pois é…

Nas cyphers que invadiram as redes sociais, nos projetos inovadores, nas produções audiovisuais: eles.
O (pouco) foco é deles.

Não se enganem, o Estado racista estruturalmente faz de tudo – e faz muito bem – pra barrar afrodescendentes  que queiram ocupar outros espaços além das condições de miséria que lhes são destinados. Não quero colocar aqui o homem negro como vilão. Quero apenas ressaltar o fato de que NÃO EXISTE TOPO SE HOMENS NEGROS E MULHERES NEGRAS NÃO SE UNIREM! Não digo isso por relações amorosas, apesar de ser algo importante a se considerar, digo isso porque precisamos nos vermos enquanto comunidade.

Precisamos enxergar no outro irmandade e parceria. Precisamos reconhecer e valorizar as ações e projetos dos nossos homens e mulheres. E principalmente valorizar o trabalho das mulheres que já são tão machucadas e esquecidas cotidianamente por todo o mundo, e certamente, não precisam que um irmão negro lhes cause isso.

“Ah, mas eu acho dahora o trabalho de várias minas!” Jura? E quantos destes trabalhos vocês compartilham nas suas redes?

Ou ainda, no caso desses projetos serem desenvolvidos em parceria com homens, quantas vezes você só se lembra quem é o homem?
‘É, amiguinhos. A coisa tá feia!

Mas ainda não é tudo, infelizmente!

MANAS

A sororidade entre mulheres é um tema exaustivamente debatido, principalmente entre militantes do movimento feminista, porém a prática desse tema por vezes se distancia e muito da teoria e as pessoas sequer percebem.

Por exemplo, quando você sabe que um casal organiza um projeto junto e ainda sim os apresenta como “Fulano do projeto Piriporinha e sua companheira”, você está pegando a teoria da sororidade e colocando no em um lugar muito distante da teoria e reproduzindo o velho e conhecido discurso machista. Pois, se a construção do projeto é coletiva e você está ciente do processo, É MACHISMO SIM o fato de você negar o devido reconhecimento à mulher em questão.

Outra situação comum e não menos agressiva é a forma com que muitas mulheres tentam se beneficiar da relação com a parte masculina/heterossexual que se possui.

MASOQ?

Sim. Pois é. Isso por si só é degradante e desrespeitoso. Agora imagine vocês quando o o “cara do projeto lá” está em um relacionamento que é de conhecimento de todos que tiverem o interesse em perguntar ou verificar o status do Facebook e as minas tentam o bote incessantemente. E para quê? Pra ganhar uma divulgação diferenciada? Um desconto na bolsa de estudos ou na peça de roupa? Um vip pra balada?

Sabe, o respeito é algo deveras precioso pra ser trocado por tão pouco e as “manas”, em especial as negras, deveriam saber isso de cor e salteado – como diria minha mãe.

É doloroso ver que seu trabalho e seu relacionamento são desrespeitados por uma foda, ou menos.

Agora pensa aí… Seja empática ou empático e responda: E se fosse o contrário?
Bem incomodo, né?!

OU SEJA

Tá faltando muita empatia por parte dos pretos e pretas daqui.

Tá faltando bom senso.
Tá faltando sensibilidade.
Tá faltando respeito.

E esse combo de ausências faz com que muitas mulheres desistam de seus projetos.

É esse combo de ausências que quando não nos faz desistir, nos adoece.

É pesado demais ver que um projeto tocado por mulheres seja testado infinitas vezes mais. É pesado demais ver que um projeto tocado por mulheres seja tão desrespeitado a ponto de ser copiado na cara larga por ser julgado de domínio público. É pesado demais ver relações amorosas e de trabalho definhando por joguinhos de favorecimento. É pesado demais esse modelo de opressão branco sendo reproduzido pelos nossos!

Passou da hora de vocês se autoavaliarem. Passou da hora de vocês serem mais. Não esperem chegar aos 47 anos pra gravar um álbum se desculpando pelas merdas que fizeram. Se percebam e evoluam.

Desejo força, paciência, sagacidade e saúde para as irmãs que se encontram nessa situação.

Estendo meu ombro e ofereço minha empatia pois entendo o quão nocivo esse sistema pode ser, ainda mais em tempos de crise política e econômica onde a conjuntura só faz nos esmagar.

Tudo que a gente mais deseja é seguir desenvolvendo mais e melhores projetos e assim será.

Não desistam e vamos juntas!

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