Ainda me lembro
eu, pivetinho
bravo
olhando pro espelho
com raiva
sangue nos olhos
mais um sonho que se vai:
minha mãe branca
moh linda
e eu preto, feio
A cara de meu pai.
Aquele puto, pervertido
cachaceiro da gandaia
cara-de-pau
largou os filhos
por um rabo-de-saia
Aí, a dona Maria,orgulhosa
bateu no peito e falou
a vida dá muitas voltas
não quero nenhum favor
crio meus filhos sozinha
e no aperreio criou.
Criou do jeito que pôde
uma conquista só sua
mas lembro que muita coisa
eu aprendi foi na rua
batendo cabeça, meio à força
Dando e tomando porrada.
Minha mãe sempre ocupada
trabalhando feito louca
e eu cada vez mais afoito
querendo sempre ajudar
se a saída é estudar
me afundei nos estudos e tal
engolindo desaforos
sempre desacreditado
tomei diversos esporros
nem sei quantos, afinal
o preto é sempre culpado
numa escola de brancos
nascidos em berço esplêndido
com sobrenome estrangeiro
nem dá pra falar direito
usando bota importada
pra me chutar o traseiro
A pobreza deixa marcas na pele
marcas piores na alma
Mas a minha inteligência não cala
minha dignidade, nem se fala
e o prazer de ser preto?
Vixe, mano, pára! //
Monahyr Campos